domingo, 29 de maio de 2011

Fonoaudiologia e Psicologia: Desafios na Prática Clínica atual - Por Marlene Danesi

                               
Fonoaudiólogos ,   assim  também  como   psicólogos   ,  precisam   enfrentar   cada vez mais   uma  clínica   em  que   se  evidenciam transtornos  de linguagem, onde o limite   das  intervenções  de  cada  um  destes    profissionais    não  é   apenas    uma  linha    fronteiriça ,  mas  um   vasto   território .Para  transitar   com  segurança  neste  complexo  contexto , tanto   os  fonoaudiólogos ,como  os  psicólogos   necessitam não só ter  domínio  teórico   dos  referenciais  básicos  sobre Linguagem e  suas alterações , como também  precisam   ter  consciência  do  seu verdadeiro papel   como terapeuta .

E ser terapeuta de linguagem é o que aproxima psicólogos e  fonoaudiólogos , entretanto  nem   todo fonoaudiólogo  é terapeuta da linguagem .Mas  sendo   terapeuta da linguagem não deixa de ser fonoaudiólogo para se tornar  psicólogo .

Para  se dedicar  à  terapêutica   da Linguagem    é   indispensável   que  o fonoaudiólogo     repense  o seu   fazer  cotidiano   para  enfrentar   os  desafios  que se apresentam na  Prática Clinica    atual , no que diz respeito a Linguagem

Na década de 80   comecei a questionar   minha  prática em direcionar   as  terapias   de Linguagem e senti necessidade  de percorrer  novos caminhos   e como     o primeiro   passo  desta  caminhada  foi me   debruçar   na  análise  das  diversas   concepções de Linguagem.                                                                                                            Aprofundar  o estudo  sobre teorias  da   Linguagem  e   relacionar  as alterações  da mesma   levantaram  muitas  incertezas   ,  mas também   deixaram uma   a  certeza : A terapia   de Linguagem   é  o lugar  apropriado   de  entrecruzamento de discursos ,   estão ancoradas diversas questões .

Passo neste momento   a fazer uma  tentativa   de  explicar   as  inter-relações  entre Psicologia  , Linguagem   e Fonoaudiologia Neste sentido   compartilho   alguns  dos  olhares   ,  sobretudo  no  processo  histórico   de  buscar   respostas   para  a   prática  clinica ,   dentro  de    minha  própria   construção    e formação   tanto  clinica   como  teórica .

.Minha proposta inicial foi partir de eixos, que  permitissem   analisar   e  aprofundar    a  discussão   entre  articulações  teóricas   e  o trabalho  terapêutico. Os eixos  abordados   foram  :  a  diferença   dos  objeto de estudo  da duas  ciências   e  a  concepção de  Linguagem  que norteia    o fonoaudiólogo   em  suas intervenções   clinicas .

Em  relação   ao  primeiro   eixo    é  imprescindível   ter  clareza   de   que    os  respectivos   espaços  profissionais   de  fonoaudiólogos    e  psicólogos   são  determinados       pela   natureza   dos  seus  objetos. Porém a delimitação destes  dois territórios nem  sempre  é  claramente   percebida  ,   muitas   vezes    os  fonoaudiólogos  se  questionam    sobre   a  possibilidade   de  invasão  das  respectivas   áreas ,   sem  o  entendimento  suficiente     de  alguns   aspectos   dessas   imbricações .

Considero que   na     busca  de   respostas    para  o  enfrentamento   dos  desafios   na    pratica   clinica ,  no  que  diz  respeito as  terapias  de Linguagem ,  é indispensável   partir   da  idéia  central   de  que  Mente (  (psiquismo )   e   Corpo   formam   uma   unidade indivisível ,  e esta  idéia   está  dada  desde   antes    do  inicio   da  psicanálise.

 A palavra é a  manifestação  do  falar verbal,  onde  acontece a   indissolúvel  fusão  entre   significado   e  som ,  uma  sonoridade   que  se   conserva   até  mesmo  nas  palavras  escritas ,  pois  precisam  de uma  voz  para  serem  palavras   , ainda   que   seja  uma  voz  silenciosa .neste  sentido  as  palavras   revelam  sentido   e  sentido pode  ser   entendido   como  direção .As  palavras   vão  tecendo  nexos   que  formam a Linguagem.

A  palavra   é  uma  ferramenta      essencial     tanto   para   o  psicólogo   como  para  o  fonoaudiólogo,   ambos  utilizam   este   instrumento  em   todas   as  suas terapias ,   entretanto     enquanto   o  psicólogo   usa   a   fala   como  instrumento    para  tratar    o  paciente ,  o  fonoaudiólogo      tem  como   objetivo   tratar    a  fala      do    paciente .   Dentro   deste  contexto uma pergunta   e  se impõe :   Um  problema   da  fala   pertence   ao  corpo   ou   a mente ?   É  certo    que    quando     um  problema   orgânico   importante     a  fala    não  existe    ou  ela   acontece   de  forma  deficiente ,   distorcendo   a  comunicação .  Mas  também   quando   existe   problemas   cognitivos  ou  emocionais   também    a  comunicação   é prejudicada .

Fica evidente, portanto não existir a      possibilidade de esquecer a materialidade da  palavra ,  sua  articulação   e  pronuncia ,    mas  também   é     impossível    negar    a  intima  relação   da  palavra   com  a  mente ,  pois  uma   palavra   sem   sentido. é  apenas   uma  seqüência  de  som .

Sendo o  fonoaudiólogo   o  profissional   responsável  pelos  distúrbios  da  comunicação,  incluindo  audição ,   fala ,voz   e    linguagem , quando  estiver   voltado  para  a terapêutica da Linguagem  necessita     dirigir   a  atenção     tanto   para  o  significado , como  para  o significante ,  tanto   para  a materialidade   da   fala ,  utilizando   técnicas   concretas   e  especificas   visando   sua  produção   correta ,    mas sem esquecer  a  função  principal  da  palavra  ,  que   é  a de se dirigir   ao  outro .  E como é  através  do    significante   que    se  estabelece    o  significado ,  se torna   impossível   separar  um  do  outro ,  assim   como  não  é possível  separar  corpo  e  mente. .

A concepção  de linguagem    é  determinante    para   nortear   o  fonoaudiólogo   em   sua  prática   clinica .Por  esta  razão  o  profissional  precisa   conhecer   muito   bem  as   estreitas   relações   entre  Linguagem,  língua  e  Fala   ,  mas  paralelamente    ter  consciência    da  importância    na  discriminação   entre  estes  termos.

.Dada a  complexidade   desta   temática ,  neste  trabalho vou  me  dedicar  a tarefa  de   transmitir,  como entendo hoje , Linguagem   e  a terapêutica  da  Linguagem ..E  sempre  que   se  fala   em linguagem   se fala   do  que  é  fundamental ,  do  que   é  constitutivo  do ser  humano .

Como  terapeuta   em  distúrbios   da   linguagem   me  foi  imprescindível     buscar   a  verdade    ,  perguntando   á  lingüística ,  a  psicologia ,  a  medicina , a   neurofisiologia   , a  psicanálise    para  poder  pensar    o  que  se passa    a uma  criança    com  dificuldades    na   aquisição   e desenvolvimento   da  linguagem .

A  linguagem  tem   em sua  natureza  a dualidade , de  por    um  lado   conter um   código ,  mas  por  outro   é    ela  que  nos  torna humanos   e   uma  face   não  existe  sem  a  outra .Para   nós,  terapeutas   da  linguagem ,  o  código    não  é  apenas   uma abstração   é  um  objeto de estudo.E de um  estudo    muito  complexo ,  que  precisamos  conhecer   em toda  sua  dimensão .O  fonológico,  o semântico  e  o sintagmático   são  níveis   lingüísticos   imersos  em   um  sistema  de oposições      a  ser  descoberto    na  escuta  de cada  criança ,  para  poder  analisar  como estão sendo realizados.

Na clinica  de  transtornos  de   Linguagem    aparecem   sintomas  lingüísticos   de  diferentes   etiologias,   alguns   em  que  não  nos  oferecem   duvidas   e  outros  nem  tanto .Exemplifico com   as  disfasias   expressivas  e  compreensivas,    nas  primeiras    encontramos   a  síndrome  fonológica-sintatica   e  a síndrome  deficitária   na  programação   lingüística ..Nas  segundas  onde  a  compreensão   do  discurso mais  complexo   está    diminuída encontramos   e  associações   semânticas   tão  particulares   que    adquirem   características    francamente   psicóticas “  

.Inúmeros   exemplos   poderiam   ser  citados , porém  depois   de  muitos   anos   de  me  perguntar  , frente   a  cada  criança   com  dificuldades   na   aquisição    e  no desenvolvimento  de  sua  linguagem ,   me  coloco   no  entrecruzamento  de  discursos  e  na certeza   que   a  Interdisciplinaridade  é  que  abre   questões   oferece    respostas  .

Finalizando posso afirmar  também  que    minha     experiência    tanto na clinica  de linguagem , como   de   docente    de disciplinas   relacionadas  à   Aquisição ,  patologia ,   avaliação   e terapias   de linguagem   me levaram  a concluir   que  o principal objetivo das  Terapias   de linguagem   é   apoiar   o  paciente   no   longa   e difícil  trajetória   de    adquirir   sua     própria fala ,  ter  seus  próprios   pensamentos  ,  dentro  das respectivas possibilidades. Este é o único caminho para alguém ser dono de  uma  linguagem verdadeira.

Porém este objetivo só  pode  ser   alcançado   se  o terapeuta   da linguagem   não destituir   o  paciente   de   seu     psiquismo ,   e   entender    que   os  sintomas    da fala   de  seu  paciente   é   uma   linguagem   que  necessita  ser  compreendida   e      que  é  através   do  próprio  discurso    que  o  paciente   toma     consciência   de suas  dificuldades .


 Marlene Canarim Danesi

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